Aqui, diretor de ensino e pesquisa desta instituição nos fala sobre experiência e esforços para transformar conhecimento em produtos e benefícios para sociedade.


Uma busca constante por soluções inovadoras e eficientes para os problemas da prática médica diária. Esta é a missão, em linhas gerais, da pesquisa, ou seja, gerar o conhecimento, e que este alavanque avanços na assistência, sendo capaz de criar, intuir, testar, criticar, melhorar, e só então implantar novas drogas, tratamentos ou novas tecnologias.

As atividades de ensino e pesquisa no Hospital Sírio-Libanês (HSL) seguem fielmente este princípio. Produzir e compartilhar conhecimento são prioridades.  As ações são efetivadas no sentido de apoiar o aprimoramento profissional de médicos, profissionais da saúde e gestores da área e estimular a investigação científica – para contribuir para uma assistência à saúde ainda melhor.

Há, institucionalmente, um minucioso trabalho por gerar dinâmicas e oportunidades para convivências diversas, e aumentando constantemente a capacidade de compartilhar os conhecimentos e experiências adquiridas. Para mais informações sobre a pesquisa, o ensino e as interseções construídas, o Centro de Apoio à Pesquisa no Complexo de Saúde da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (CAPCS/UERJ) conversou com Luiz Fernando Lima Reis, Ph.D., Diretor de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês e Coordenador do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Ciências da Saúde do Hospital Sírio-Libanês.


CAPCS/UERJ – Cresce atualmente a necessidade dos centros de apoio aos pesquisadores – congregando forças e capacidades em prol da pesquisa. É correto, portanto, considerarmos que, para o êxito final de um projeto de pesquisa, o trabalho eficaz de um escritório ou centro de apoio seja vital no processo?

Luiz Fernando Lima Reis – No mundo atual, onde os recursos humanos são cada vez mais especializados e os recursos financeiros são cada vez mais escassos, os ganhos em produtividade, qualidade e, muito relevante, obediência às regras de compliance e potenciais conflitos de interesse impõem um novo patamar de profissionalismo na condução de projetos de pesquisa.  É nesse contexto que, em qualquer organização que valoriza a geração de conhecimento, o escritório de projetos se torna uma condição necessária para o sucesso da pesquisa.


CAPCS/UERJ – E quanto ao papel do gestor…

Luiz Fernando Lima Reis – É papel do gestor prover aos seus pesquisadores as melhores condições de trabalho e os recursos organizacionais (recursos financeiros, recursos humanos, infraestrutura), para que esses pesquisadores se preocupem apenas e tão somente com a parte mais relevante da pesquisa: a sua contribuição intelectual.  Nesse cenário, a instituição garante a maior produtividade do pesquisador e, ainda, os altos padrões de qualidade para a aprovação de recursos e todas as demais obrigações que giram em torno da atividade de geração de conhecimento.

 

Pesquisas em Oncologia

CAPCS/UERJ – Nos últimos anos, o senhor se dedicou aos estudos de marcadores moleculares em câncer, com ênfase em métodos de diagnóstico precoce e definição de marcadores de resposta e comportamento do tumor. Poderia nos falar sobre desenvolvimento dos estudos e evidências científicas nesta área.

Luiz Fernando Lima Reis – O câncer precisa ser entendido como resultado de alterações no genoma que, necessariamente, resultam numa vantagem seletiva das células alteradas sobre as demais células do tecido.  Um acúmulo sucessivo dessas alterações e, por consequência, aumento das vantagens seletivas, levam ao aparecimento do tumor.  Acontece que, dentro de uma mesma massa tumoral, o acúmulo de mutações varia significativamente de célula para célula.  Isso explica a enorme heterogeneidade tumoral.  Um tumor é, na verdade, uma coleção de diferentes tumores! E, muito importante, essas diferenças intratumorais são dinâmicas e se alteram em função de pressões seletivas.  Por exemplo, disponibilidade de oxigênio, escape do sistema imune, maior ou menor sensibilidade a drogas, etc.


CAPCS/UERJ – E os avanços hoje…

Luiz Fernando Lima Reis – É essa heterogeneidade [ressaltada na questão anterior] que explica as diferenças de resposta ao tratamento, recidivas, resistências, etc.  Por consequência, identificar essas diferenças intra-tumorais e suas consequências na biologia dos tumores tem enorme impacto na conduta e manejo desses pacientes.  Os grandes avanços de hoje na busca de biomarcadores advém da nossa capacidade de amostrar e entender a dinâmica dessa heterogeneidade.  Com os avanços da PCR Digital e sequenciamento de DNA tumoral circulante, a biopsia liquida (que é o estudo de fragmentos do DNA tumoral presente no plasma) esses biomarcadores possuem hoje grande impacto na clínica.

 

Pesquisa e inovação no ambiente hospitalar

CAPCS/UERJ – Poderia nos falar, especificamente, sobre a importância das atividades de pesquisa e inovação dentro do ambiente hospitalar e sua relevância para o desenvolvimento da atividade assistencial.

Luiz Fernando Lima Reis – Primeiro, é preciso reconhecer que existem excelentes hospitais no Brasil e no exterior que não estão envolvidos nas atividades de pesquisa e geração de conhecimento.  Isso posto, é também importante observar que, ano após ano, os melhores hospitais americanos são todos instituições acadêmicas, fortemente envolvidos na geração de conhecimento.  E isso não é por coincidência.  Os hospitais envolvidos em pesquisa e geração de conhecimento estão, na verdade, definindo os avanços da prática assistencial.  Essa atividade de pesquisa e geração de conhecimento está também associada às atividades de ensino, formação, retenção e atração de talentos e ainda, associada à atração de parceiros e fornecedores de tecnologia.  Todo esse ambiente se reverte na oferta de novas tecnologias que, em última instância, beneficiam os pacientes.  Assim, àqueles hospitais que não estão envolvidos na geração de conhecimento, ainda que de excelência, estão sempre à espera das novas tecnologias para que possam então ser incorporadas.

 

Linhas de pesquisa no Sírio-Libanês

CAPCS/UERJ – Sobre as linhas de pesquisa e o programa de pós-graduação do Hospital Sírio-Libanês (HSL).

Luiz Fernando Lima Reis – Nossas linhas de pesquisa e nosso programa de pós-graduação estão alinhadas com nossas áreas estratégicas:  Pesquisa e Desenvolvimento em Oncologia e assistência ao paciente oncológico, Pesquisa e Desenvolvimento em cirurgia minimamente invasiva, e Pesquisa e desenvolvimento em medicina intensiva e no paciente crítico.

Temos ainda linhas bastante fortes em Bioengenharia de tecidos e o uso de células troncos e medicina regenerativa, Avaliação de tecnologias em saúde, e Dor.

Nosso programa de PG (Mestrado e Doutorado em Ciências da Saúde) é multiprofissional e privilegia projetos com aplicabilidade na prática assistencial

 

Startups e inovação

CAPCS/UERJ – Existe uma tendência de crescimento dessas iniciativas (envolvendo startups) na área da saúde. Como estão sedimentadas hoje e quais as perspectivas.

Luiz Fernando Lima Reis – O Hospital Sírio-Libanês possui uma Superintendência de Inovação e forte parceria com startups.  Hoje, estamos dedicando muitos esforços na área de ciências de dados e o uso de estratégias de inteligência artificial e aprendizado de máquinas para apoio à decisão. Também, temos muitos projetos nas áreas correlatas à transformação digital, em especial na experiencia do paciente, e na telemedicina.


CAPCS/UERJ – Há um concurso de startups na área de saúde mantido pelo Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE). Poderia nos falar sobre esta iniciativa, e associação com o Hospital Sírio-Libanês (HSL).

Luiz Fernando Lima Reis – Essa é uma iniciativa muito importante realizada pelo Einstein e por outras instituições.  Instituições de maior porte possuem, de modo geral, pouca flexibilidade, maior aversão ao risco e ao erro, e grande demanda de tempo e esforços nas suas atividades centrais.  No caso do HIAE, assim como o HSL, nosso foco é o processo assistencial.  Por isso, associações com startups trazem maior velocidade e agilidade na solução de problemas.  Nas startups, “errar cedo” e “errar barato” são regras do jogo.  Assim, por meio dessas associações, conseguimos internalizar soluções rápidas que, de outra forma, nos custaria tempo e dinheiro.  No HSL, por 4 anos fomos patrocinadores do Prêmio Empreenda Saúde, em parceria da a Fundação Everis.  Foram quase 1000 startups avaliadas nesses 4 anos de prêmio, e vários dos projetos finalistas estão hoje sendo incorporados como solução para nossos problemas, e problemas de outras instituições de saúde.  A Fundação Everis segue agora com o prêmio, de muito sucesso, em parceria com outras instituições.

 

Transformar conhecimento em produtos

CAPCS/UERJ – Caminhos para diminuirmos o distanciamento entre universidades e empreendedores… Como melhor prospectar recursos e apoio às iniciativas em pesquisa?

Luiz Fernando Lima Reis – Aqui, é fundamental entender que, se a atividade de pesquisa reflete a transformação de recursos financeiros em conhecimento, a inovação é o caminho da volta.  Ou seja, transformar conhecimento em dinheiro.  Não necessariamente dinheiro moeda, mas qualquer forma tangível de benefícios à população que, em última instância, financiou a atividade de pesquisa.  Nesse sentido, é premente a necessidade de aproximação entre a academia e o setor produtivo.  No Brasil, o conhecimento está na academia, em especial nas universidades e institutos públicos de pesquisa.  Logo, é fundamental que o setor público saiba conversar com o setor privado que, em grande medida, é responsável pelos processos de inovação.

Essa aproximação é fundamental para que possamos alavancar o processo de inovação e, ao mesmo tempo, trazer novos recursos e novos desafios para a geração de conhecimento, em especial com maior foco em projetos de aplicabilidade imediata.


CAPCS/UERJ – Poderia nos citar exemplos, já construídos, dessa aproximação…

Luiz Fernando Lima Reis – Temos dois exemplos de sucesso dessa aproximação no Brasil.  No Rio de Janeiro, a estreita parceria entre UFRJ / Petrobrás e todo o complexo de indústrias desenvolvedoras de tecnologias na área de energia e petróleo.  E em São Jose dos Campos, na aproximação entre o ITA, a EMBRAER, e a indústria da aviação.


CAPCS/UERJ – É, portanto, inadiável que as universidades possam aproximar e transformar o conhecimento produzido em produtos e processos para a sociedade – nos âmbitos pesquisa, ensino e extensão.

Luiz Fernando Lima Reis – Sim, certamente, conforme ressaltado anteriormente. É fundamental que as instituições públicas de ensino e pesquisa entendam sua responsabilidade na devolução de soluções para os problemas da sociedade.  É a sociedade que custeia essa atividade de pesquisa e a universidade não pode ficar distante da sociedade, sob a proteção de uma liberdade acadêmica.  Essa liberdade acadêmica deve, necessariamente, vir acompanhada da responsabilidade de retorno dos impostos que custeiam a vida universitária.  A Universidade precisa dar respostas urgentes aos desafios da sociedade e essa resposta passa pela transformação do conhecimento em inovação e benefícios que possam melhorar a qualidade de vida e a transformação social que seja mais justa e inclusiva.



Por Felipe Jannuzzi
Jornalista do CAPCS/UERJ