Inovação, integração, tecnologia em saúde e excelência. Essas são palavras-chave fundamentais para concebermos um entendimento exato sobre potencialidades, apoio interdisciplinar e estrutura do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Universitário Pedro Ernesto, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (HUPE-UERJ).



No mês de agosto, o Serviço de Neurocirurgia do HUPE realizou, com pleno sucesso, em dois dias, quatro cirurgias de Parkinson. Sem dúvida, algo a ser celebrado não só pelos profissionais envolvidos, mas pelo Complexo de Saúde da Universidade, como um todo. Por ser um procedimento que requer complexidade e tecnologia avançada, de alta precisão, ele é realizado por poucos hospitais no Brasil. As cirurgias recentes denotam certo grau de ousadia e sobretudo reforçam o conceito de inovação constantemente buscado pela Universidade.

Então, para mais informações sobre a doença de Parkinson, as novas percepções científicas, sobre os procedimentos realizados e a estrutura do Serviço de Neurocirurgia do HUPE, o Centro de Apoio à Pesquisa no Complexo de Saúde (CAPCS) da UERJ dialogou com Flavio Nigri, Coordenador da Disciplina e Chefe do Serviço de Neurocirurgia do HUPE-UERJ. Vejamos os avanços.


CAPCS-UERJ – Recentemente [no mês de agosto], a Neurocirurgia do HUPE realizou, em dois dias, quatro cirurgias de Parkinson, com sucesso. Sem dúvida, feito a ser celebrado pela equipe. Fale-nos sobre a dinâmica destes procedimentos cirúrgicos e o quão de inovação representam ao Hospital.

Flavio Nigri – Sim, conseguimos fazer quatro cirurgias de implante de estimulador cerebral profundo (DBS) em dois dias, feito inédito no HUPE e raramente visto em outros hospitais do mundo. Realmente tivemos certo grau de ousadia, mas a qualidade das equipes que participam do projeto fez toda a diferença. Os casos foram muito bem indicados e avaliados pela equipe da neurologia, o que facilitou o procedimento e a obtenção de um excelente resultado. Tivemos também no processo seletivo a avaliação fonoaudiológica, fisioterápica e neuropsicológica. Os exames de imagem de ressonância magnética e tomografia computadorizada foram realizados segundo protocolo estabelecido com a equipe de neuroradiologia do projeto. Houve grande mobilização por parte da enfermagem do HUPE para a logística de internação, marcação dos procedimentos e esterilização dos materiais. Temos uma equipe clínica que cuidou dos detalhes pré-operatórios e uma equipe de anestesia especializada com grande experiência para esse tipo de procedimento que é realizado com o paciente acordado. Tivemos todo suporte da empresa Medtronic que forneceu os aparelhos de estereotaxia e software de navegação de última geração para o implante. Contamos com a presença do Dr. Murilo Marinho, da Escola Paulista de Medicina, que orientou os procedimentos.


CAPCS-UERJ – Fale-nos, por favor, um pouco mais sobre o procedimento…

Flavio Nigri – Quanto ao procedimento, inicialmente colocamos o arco de estereotaxia no paciente com anestesia local. O paciente é levado ao tomógrafo onde realiza um exame de crânio. As imagens de tomografia e ressonância são fusionadas no computador onde será estabelecido o alvo ideal para o implante e o seu trajeto ideal dentro do cérebro. O eletrodo é implantado com o paciente sob o efeito de leve sedação e feita estimulação com o paciente acordado. Neste momento a equipe de neurologia avalia os efeitos da estimulação para checar se o posicionamento está no local desejado. O arco é retirado e sob o efeito de anestesia geral implantamos o gerador de estimulação.

Colocação do arco estereotaxico


Inovação e referência


CAPCS-UERJ – Sem dúvida, o procedimento representa inovação no Complexo de Saúde da UERJ…

Flavio Nigri – Para o HUPE é uma grande inovação. Trata-se um procedimento que requer tecnologia avançada de alta precisão. Com o apoio da Secretaria Estadual de Saúde (SES), da UERJ, da Direção e do setor administrativo do HUPE, conseguimos montar uma estrutura de alto padrão para oferecer o tratamento cirúrgico para a doença de Parkinson com toda segurança.


CAPCS-UERJ – Atualmente, além das diversas terapias medicamentosas existentes, as cirurgias se tornaram muito mais precisas e menos lesivas. Fale-nos um pouco sobre o panorama geral envolvendo a doença de Parkinson.

Flavio Nigri – A cirurgia para a doença de Parkinson é indicada quando há falência do tratamento medicamentoso. Depois de certo tempo a medicação vai ficando menos eficaz. Há necessidade de aumentar a dose e reduzir os intervalos. O paciente então começa a apresentar os efeitos colaterais relacionados à irregularidade da ação da medicação. Então vamos ter pacientes que a ação da medicação fica variando, em curtos intervalos de tempo, entre uma ação exagerada causando movimentos anormais, e uma ação quase ausente causando fenômenos de imobilidade e piora dos tremores. A cirurgia ajuda a reestabelecer esse equilíbrio, modulando áreas que estão hiperativas pela doença.

Planejamento do alvo e seu trajeto no cérebro


CAPCS-UERJ – Como hoje está configurada a estrutura da Neurocirurgia do HUPE. Equipe, novos materiais, tecnologias…

Flavio Nigri – Hoje contamos com uma enfermaria toda reestruturada com disposição de quartos com 2 a 3 leitos e banheiro privativo. Tomógrafo portátil para a realização de exames na própria enfermaria. Disponibilidade de exames de ressonância magnética e tomografia no hospital. Temos aparato tecnológico completo para a realização das neurocirurgias como um moderno microscópio cirúrgico com filtros para identificação de tumores e fluxo nos vasos cerebrais, neuronavegador, neuroendoscópio, aspirador ultrasônico, aparelho de estereotaxia, gerador de radiofrequência para neurocirurgias ablativas e neuromonitorização eletrofisiológica. Neuropatologista e suporte multidisciplinar de equipes de outras especialidades. Temos também um laboratório de Estimulação Elétrica Cerebral (LABEEL) onde são realizadas pesquisas com estimulação magnética transcraniana (TMS), estimulação por corrente contínua e mapeamento cortical pré-operatório neuronavegado com TMS para as cirurgias de tumores e lesões cerebrais em áreas eloquentes.

Implante do eletrodo


CAPCS-UERJ – Fale-nos um pouco sobre a Clínica de Dor.

Flavio Nigri – A Clínica da Dor está em reforma onde teremos dois leitos equipados para procedimentos de alta complexidade e área para procedimentos de acupuntura. Hoje se encontra em funcionamento provisório na enfermaria da neurocirurgia e nos ambulatórios. O projeto com a SES, para atendimento dos pacientes com dor crônica, oncológica e neuropática, encontra-se em pleno funcionamento com grande número de atendimentos e procedimentos.


CAPCS-UERJ – Quais são os procedimentos cirúrgicos hoje realizados no Serviço de Neurocirurgia-HUPE?

Flavio Nigri – Realizamos quase a totalidade de cirurgias da especialidade, com intervenções na coluna vertebral e no sistema nervoso central e periférico. Tumores cerebrais, da medula espinhal e da coluna vertebral, aneurismas cerebrais, hérnia de disco, estenose do canal raquiano, hidrocefalia, malformações congênitas e neuralgia do trigêmeo estão entre alguns exemplos. Atualmente realizamos em média 36 cirurgias por mês.


Pesquisas e interdisciplinaridade


CAPCS-UERJ – Fale-nos, por favor, sobre projetos e pesquisas realizadas no âmbito da Neurocirurgia no Complexo de Saúde da UERJ.

Flavio Nigri – Temos projetos de pesquisa em cirurgia da coluna, doença de Parkinson, tratamento da dor, estimulação cerebral, hidrocefalia, neuralgia do trigêmeo entre outras. Os projetos são vinculados a FCM com alunos de iniciação científica e com a PGCM com alunos de mestrado e doutorado orientados pelo serviço. Temos pela Clínica da Dor o seu curso de especialização.


CAPCS-UERJ – A interseção com outros Serviços/Equipes dentro do Hospital. O que nos diz sobre a relevância da interdisciplinaridade no êxito dos procedimentos cirúrgicos?

Flavio Nigri – Atualmente só conseguimos avançar na especialidade com o apoio interdisciplinar. Por exemplo, nas cirurgias da coluna temos a presença da Ortopedia no grupo, nas cirurgias de hipófise, o apoio da equipe da otorrinolaringologia, no Parkinson a equipe de neurologia. Temos a cirurgia de cabeça e pescoço, cirurgia do tórax e cirurgia geral para os acessos cirúrgicos complexos na coluna vertebral, a cirurgia plástica para as deformidades cranianas. Para procedimentos vasculares cerebrais, a Neuroradiologia e a Cirurgia vascular, na Clínica da Dor, os anestesistas e na monitorização intraoperatório, o neurofisiologista. Setores de terapia intensiva e serviço de diagnóstico por imagem são fundamentais. Em resumo, todas as disciplinas e serviços estão interligados.


“Ilha de excelência”


CAPCS-UERJ – Recentemente, o HUPE passou por séria crise econômica, porém manteve-se vivo em face do comprometimento, envolvimento e dedicação de suas equipes e profissionais. Como vê hoje o momento do Hospital?

Flavio Nigri – Estamos em um momento excepcional no HUPE, onde conseguimos resgatar a condição de atendimento comparáveis aos melhores hospitais públicos e privados do RJ. Mérito da Direção anterior, da Direção atual e de todos os profissionais do HUPE que mantiveram o compromisso de manter vivo o nosso hospital. Sabemos que a condição financeira do Estado do Rio de Janeiro ainda está em situação crítica e certamente teremos que enfrentar novas turbulências. Essa terrível crise nos revelou o HUPE como um excelente parceiro da SES para o atendimento da população do RJ oferecendo uma medicina de baixo custo, alta qualidade, compromisso e aplicação responsável dos recursos destinados.


CAPCS-UERJ – Mensagem final aos que nos leem agora. Fique à vontade para ressaltar algo mais [sobre qualidade de vida ou o Serviço em si] ou expressar alguma outra informação, porventura aqui não pontuada.

Flavio Nigri – Devo toda a minha formação a UERJ e ao HUPE no qual fiz meu curso de medicina, residência médica, mestrado e doutorado. Conheci a época áurea da nossa instituição e o seu período decadente. Por todo esse momento difícil que nós passamos, nos dedicamos a manter o serviço funcionando e se desenvolvendo, acreditamos sempre em tempos melhores. Hoje, colhemos os frutos do nosso esforço. Não poderíamos admitir o fim dessa ilha de excelência na formação de profissionais de saúde, e que tanto contribui para a qualidade da medicina praticada no nosso Estado.



Por Felipe Jannuzzi

Jornalista do CAPCS-UERJ